- Historiador com doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro, colaborador com a imprensa e autor de 26 livros.
É preciso reforçar: o vasto território em que se desenvolveram as regiões norte e noroeste fluminense, assim como o sul do Espírito Santo, apresenta características singulares que deviam ser ensinadas nas escolas, e não apenas serem conhecidas de estudiosos (o que também pouco acontece). A parte mais antiga remonta a mais de 600 milhões de anos. É a zona serrana conhecida com o nome de Imbé (Serra do Mar). Num determinado ponto, ela sofre um rebaixamento brusco, abrindo passagem para o rio Paraíba do Sul, e continua na margem esquerda deste em feição baixa. Aos poucos, ela vai novamente ganhando altitude. Com a divisão do Brasil em capitanias, províncias e estados, ainda no estado do Rio de Janeiro, mas principalmente no Espírito Santo, a serra volta a ganhar altitude.
À zona serrana, acopla-se um vasto terreno baixo constituído por tabuleiros, planícies aluviais e restingas. As idades de tais formações variam entre 5 milhões e 2.500 anos. Quase todos os rios que cortam esse território provêm da zona serrana, atravessam tabuleiros, formam planícies fluviomarinhas e desembocam no mar ou são afluentes desses rios que deságuam no oceano.
De norte para sul, acompanhemos os rios que desembocam no mar, pois eles permitem identificar as bacias hídricas que irrigam esse peculiar terreno hoje dividido entre os estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. O primeiro rio é o Itapemirim, que limita a unidade norte de tabuleiros. Ele nasce na zona serrana, conta com vários afluentes e subafluentes, separando nitidamente uma zona pedregosa de uma zona argilosa. Ele constitui o limite do que denominamos ecorregião de São Tomé. Em direção ao sul, o segundo rio mais expressivo é o Itabapoana, também com nascente na zona serrana e atravessando vasta extensão de tabuleiros. Entre ele e o Itapemirim, existem vários córregos com nascente nos tabuleiros e
Sempre rumo ao sul, assinalamos o pequeno rio Guaxindiba, cuja nascente se localiza na zona serrana e foz no mar. Também entre o Itabapoana e o Guaxindiba, correm quase extintos pequenos cursos d’água com foz no mar. Continuando a caminhada em direção ao sul, encontraremos o rio Paraíba do Sul, o maior da região. Ele é o principal construtor da planície fluviomarinha do norte fluminense, conhecida por Planície Goitacá. Sua nascente se localiza na Serra do Mar, localmente conhecida como Serra da Bocaina, atravessa o planalto, corta tabuleiros e desemboca no mar por um delta instável formando originalmente por quatro braços: Gargaú, Atafona, Gruçaí e Iquipari. De forma auxiliar, usava a foz do rio Iguaçu. hoje bastante degradados.
O Iguaçu é hoje um rio desconhecido daqueles que habitam a região. Melhor dizendo, é mais desconhecido que os outros, pois nossa cultura ignora os rios. Só se pode compreender o rio Iguaçu no seu contexto. Ele é a parte final de um complexo formado pelos rios Imbé e Urubu. Pequenos rios descem da serra e são coletados pelo Imbé. Ele e o Urubu formam a lagoa de Cima que, por sua vez, escoa pelo rio Ururaí. No passado, o rio Preto desembocava no Paraíba do Sul. Nas cheias, parte de suas águas corriam para o Ururaí por um braço auxiliar. Agora, só esse braço está ativo. O Ururaí e o Macabu, por sua vez, desembocam na grande lagoa Feia e esta escoava por inúmeros braços que formavam o rio Iguaçu. Por fim, este chegava ao mar. Intervenções humanas transformaram o rio Iguaçu na lagoa do Açu.
Da barra da lagoa do Açu à Barra do Furado, encontramos um longo, alto e estreito cordão arenoso em que vai se erguer o Farol de São Tomé. Nada nesse trecho se assemelha a um rio, exceto o Lagamar, que, no passado, abria sua barra quando das cheias causadas pelas chuvas. Era uma espécie de foz auxiliar do rio Iguaçu. O canal da Flecha não existia originalmente. Ele foi aberto por ação humana para abreviar o curso do rio Iguaçu. A história da abertura da Barra do Furado e do canal da Flecha será contada no seu devido tempo.
Continuando nossa caminhada para o sul, entramos numa bela restinga repleta de lagoas circulares, ovais e alongadas. Estas últimas eram cursos d’água que foram fechados por força do mar ou falta de força dos rios. Os mais conhecidos são as lagoas Preta, do Paulista, Carapebus, Comprida e Jurubatiba. Chegamos ao fim do vasto terreno baixo no rio Macaé. Na margem esquerda dele, um pontal de areia indica o final da planície. Na margem direita, formações pedregosas indicam que estamos num terreno mais ligado à Região dos Lagos que à planície. Todos os rios mencionados – grandes, médios e pequenos – merecem mais análise. Haverá oportunidade para detalhar cada um deles.