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Rio Paraíba vive a pior seca em quase nove décadas

“Sem chuva, com muitos desmatamentos e vários impactos, o cenário do rio Paraíba é o pior em 85 anos”

Uma imensidão onde é possível ver mais areia do que água, em plena seca do rio Paraíba do Sul no Norte e Noroeste Fluminense, mas também todo leito do rio desde a nascente a foz, os cenários de vazios estão por toda margem. Uma crise hídrica que já é considerada a maior nos últimos 85 anos. Estamos vivendo uma seca desde 2014 e nunca melhorou, um período longo de estiagem, muitos meses sem chuva tanto no estado de Minas Gerais como também, no Rio de Janeiro. E qual é o papel da população em tudo isso?

Todos os anos nesta época do ano virou uma constante esse nível, sempre em torno de de 4,70, hora 4,80, vazões abaixo do que é considerado ecológico do rio, por isso, que é possível ver os bancos de areia no rio. “Realmente o rio está muito baixo, mas isso é uma constante de todos os anos, isso que está causando o fechamento da foz em Atafona. Uma das implicações mais sérias é a redução de vazão são duas coisas: a chuva mudou e estão mais concentradas, chove muito no verão e nada no inverno”. Explicou diretor-presidente do Comitê Baixo Paraíba do Sul e Itabapoana, João Siqueira.

A RJ 158 é toda margeada pelo Paraíba, do alto a visão do vale mostra como a situação é grave. De acordo com o historiador e ambientalista, Arthur Soffiati, devemos considerar a questão dos níveis altos e baixos dos rios pela perspectiva quantitativa. “Afinal, sem números precisos não podemos fazer afirmações qualitativas. E questão qualitativa é que os níveis dos rios, no caso específico, o rio Paraíba do Sul em seu trecho final, estão oscilando muito. Eles estão se afastando da média para se situarem nos extremos. Ou muito acima ou muito abaixo dos níveis médios. O inverno já passou. O nível já devia estar subindo, mas ainda se apresenta muito baixo”, explica Soffiati.

Infelizmente tudo o que está acontecendo é um reflexo da degradação, falta de ações públicas e porque não, consciência das pessoas que vivem o Paraíba. “Existe uma conjugação de fatores para explicar o baixo nível. Primeiramente, o desmatamento. Depois, o assoreamento, que eleva o leito do rio e o torna mais baixo. Em seguida, a sequência de represas, que forma uma espécie de fila indiana de lagos e estreitos cursos d’água. Por fim, o que é muito preocupante, a transposição de 2/3 do rio para o sistema Guandu a fim de abastecer 9 milhões de pessoas do grande Rio de Janeiro”, afirma Soffiati.

Existe uma mudança estrutural na bacia do Paraíba do Sul, assim como em outras bacias das Regiões Sudeste e Centro-Oeste. “O desmatamento e o consumo excessivo de água pela grande urbanização ultrapassam os limites dos rios. A água das chuvas não se infiltra mais como antes no solo e não alimenta o lençol freático. As chuvas correm para os rios sem serem retidas como antes e acabam no mar rapidamente. Estamos perdendo água doce no continente. Mesmo que a evaporação devolva essa água ao continente, ela não é retida devidamente. Antes, havia mais mecanismos de retenção no continente, como as florestas e várzeas marginais. Elas foram derrubadas e ocupadas. As cheias se transformaram em enchentes e as estiagens em secas”, destaca Soffiati.

Se o cenário é triste ao longo do rio, na foz no distrito de Atafona, em São João da Barra, o problema chega ainda maior. Vem acontecendo a intrusão salina, que significa que a água que vem para a população contém sal. “São João da Barra para duas vezes por dia o abastecimento de água no centro da cidade, porque o sal chega nas bombas. Isso é muito ruim essa condição do rio, ele está morrendo é o que podemos dizer”, explica João Siqueira.

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Perigo na cheia

O assoreamento do rio é visto agora muito fácil, com os bancos de areia visíveis, a calha do rio desapareceu. Isso é causado pela baixa vazão, já que aumenta a deposição de areia, quando vem a cheia a situação fica grave. ” E como se seu ralo tivesse entupido, explode para os lados. Como o rio não tem calha para passar a água, para drenar a água para o mar e água vai para lateral enchendo as cidades, rompendo os diques, como aconteceu em Barcelos, em Três Vendas, em Caçimba perto de Gargaú, isso tudo é causado pela seca que estamos vivendo”, afirma João.

Economia de água

Se houvesse uma mudança de hábitos em casa, principalmente neste período, seria mais um recurso para tentar amenizar os impactos da crise hídrica. “A economia doméstica de água contribuiria minimamente para mudar esse quadro. Quem mais consome água são a agropecuária e a indústria. Primeiro, é preciso reflorestar pontos críticos, como áreas de recarga, nascentes, encostas de morro e margens de rio, do menor ao maior. Depois, é preciso otimizar a transposição para o Guandu, reduzindo o volume de água transposta e não permitir mais nenhuma transposição. A bacia do Paraíba do Sul está saturada quanto ao fornecimento de energia hidrelétrica. Já passou da hora de usar energia solar e eólica”, afirma Soffiati.

O ambientalista confirma ainda que existe uma crise muito maior que imaginamos. “A crise é maior do que podemos supor. Ela é estrutural, como já foi dito. Existe um fator a agravá-la: as mudanças climáticas. Ou chove muito ou chove muito pouco. Ou as chuvas causam enchentes ou secas”, finaliza Soffiati.

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