- Jornalista, Gestora Ambiental e pós-graduada em Energia, Sustentabilidade e Empreendedorismo
Já se passaram 20 anos que a água ficou negra nos rios Pombas e Paraíba do Sul, moradores de alguns municípios de Minas Gerais e Rio de Janeiro, sofreram com impactos de um dos maiores desastres ambientais que aconteceu na região. Sem peixes, vegetação morta, nada de água para o abastecimento das casas e uma incerteza que não tinha fim. Como tudo na vida passa, as pessoas enfrentam e depois, acabam esquecendo de tudo que viveram. Parece que foi exatamente o que aconteceu com a macha negra que tomou o Paraíba.
Na época eu tinha 21 anos, estava no último ano de faculdade de jornalismo, em Campos dos Goytacazes, cidade que vivia há pouco mais de três anos. Eu já fazia estágio na TV Record, ou seja, mesmo sem registros fotograficos pessoais, me recordo claramente de como foi a “loucura” na redação para apurar esse desastre. Lembrando que era 2003, então não tinha celular direito, internet de péssima qualidade e nada de google. Era encontrar as pessoas na base da lista telefônica e muita coragem, sem contar que na rua, os repórteres não voltavam pra redação enquanto não conseguiam fechar o material com bons personagens. Bons tempos não?
O fato é que foi um dos piores desastres que aconteceu ao longo do rio Paraíba do Sul, era que os especialistas falavam, as autoridades repetiam e a população assistia a tudo incredúla. A empresa onde a barragem rompeu, foi multada em 50 milhões de reais, era a multa mais alta que poderia ser aplicada, um dos donos chegou a ser preso pelo Polícia Federal, mas efetivamente sabemos que mesmo sendo um crime ambiental, parece ter ficado impune. De 1982 até hoje, foram pelo menos oito desastres como este, cada um com seu perfil próprio e devastador no rio.
E de quem é a culpa do esquecimento? A gente ficou um tempão sem ter segurança para comer peixe, usar a água do rio e até se banhar. Uma catastrófe total, enquanto estagiária do último ano de jornalismo, produzi pautas e até fiz inúmeras matérias meses e anos depois do desastre, aquela “suíte da suíte” bem popular no jornalismo. Mas sabe, essa história também ficou esquecida pra mim e só voltou a tona, depois que encontrei um tio do meu marido, meses atrás, no distrito de Ernesto Machado, em São Fidélis.
Era um feriado, fui com meu marido e minha filha deixar uma encomenda na casa do tio, o quintal dele dá para o rio e como boa apaixonada que sou pelo lugar, fui dar uma espiadinha no Paraíba. Achei o rio cheio, meio escuro e ele disse que estava tudo bem. Ah esqueci de falar, o tio é pescador e conhece cada centímetro do Paraíba pela aquelas bandas. Foi então que ele falou sobre o desastre de Cataguazes, o fato é que o pescador mesmo, nunca esqueceu e talvez nunca esqueça. Foi então que tudo que vivi na época veio como filme na minha mente.
Pensei que abordar o tema em um programa do Rota Verde seria uma boa, um problemão desses com certeza eu iria encontrar um vasto material de pesquisa, imagens e entrevistas. Foi então que quando comecei a apurar a matéria dei falta de tudo, quase não encontrei imagens sobre o acontecimento, a busca na internet também foi fraca e as imagens de péssima qualidade. Já nas universidades que busquei, encontrei apenas um relatório que pontuou o fato e mostrou alguns meses após o desastre, nada mais profundo. Na verdade, ninguém se interessou em estudar mais a fundo o desastre. Isso me causou muito espanto, nenhuma pesquisa de TCC e nem de mestrado, nada.
Mandei email e liguei para o Ibama, que não respondeu até hoje. Solicitei informações do Inea, que me mandou alguns detalhes, mas só o trivial. Só sei que no fritar dos ovos, o pescador foi o principal arquivo, tanto Seu Lenilson do bairro da Coroa, em Campos, como também, os pescadores que conversei na Colônia em Atafona. Até hoje, todos eles esperam com documentos já amarelos, a tal indenização que teriam direito. O dinheiro? Nunca receberam.
E o rio será que mudou? A gente olha o infinito do rio Paraíba cortando o município de Campos, contempla sua chegada na foz em São João da Barra e tem certeza da força que ele tem. Foram oito desastres, tantos e de tantas formas. A foz já mudou de lugar, porque com vazão baixa, o Paraíba está cada dia mais fraco. Dá pena de ver tanta erosão, falta de mata ciliar e seu volume baixo, como se a seca de 2013 ainda estivesse no loop infinito. A gente sabe que não é só isso, o Paraíba carrega “nas costas” o estado inteiro, responsável pelo abastecimento de quase todo Rio de Janeiro. O desastres pode até ficar esquecido, mas esse rio não, porque se um dia ele acabar, espero que isso não aconteça, não vamos ter água em casa, nem peixes e muito menos sua imponência. Salve o Paraíba do Sul!
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