Piscicultores antecipam retirada de peixes dos tanques por medo de contaminação no Ribeirão Fartura; prejuízos em Ubarana já ultrapassam R$ 1 milhão
A cidade de Zacarias, no interior de São Paulo, iniciou no último sábado (22) uma manobra emergencial para salvar a produção local de tilápia em tanques-rede, após uma grande mortandade de peixes atingir produtores na vizinha Ubarana (SP). O episódio acende um alerta para o setor aquícola da região, especialmente em pleno período da Quaresma, quando o consumo de pescados aumenta significativamente.
Segundo os produtores, o temor é que o mesmo problema — causado pela falta de oxigênio nas águas do Ribeirão Fartura, um dos braços do Rio Tietê — atinja também Zacarias, a segunda maior produtora de tilápia do estado de São Paulo.
Medida de urgência: antecipação da colheita de tilápias
O piscicultor Rômulo Cury, um dos afetados, relata a corrida contra o tempo:
“Estamos em uma missão de urgência. Não sabemos se vai amanhecer com os peixes vivos na água. O prejuízo em Ubarana foi enorme e tentamos evitar o mesmo aqui”, afirmou.
A produção de tilápias em Zacarias é estratégica não só para o estado, mas para a cadeia de abastecimento nacional. O receio é que o evento ambiental comprometa seriamente a continuidade da atividade na região.

Risco ao mercado e empregos
Emerson Esteves, diretor da Associação de Piscicultores em Águas Paulistas e da União (Peixe SP), enfatizou a gravidade da situação:
“Zacarias é o segundo maior polo produtor de tilápia em tanque-rede do estado. O impacto é gigantesco para o mercado e para os produtores. Trabalhamos o ano inteiro para abastecer a Quaresma. Ver tudo isso ameaçado é inadmissível.”
Ele também alerta que diversos piscicultores já abandonaram a atividade, desmotivados pelos prejuízos recorrentes dos últimos anos.

Ubarana: perdas de mais de R$ 1 milhão e toneladas descartadas
Na cidade de Ubarana, mais de 30 toneladas de peixes tiveram de ser descartadas nos últimos dias. Dois piscicultores, responsáveis por 39 tanques no total, perderam toda a produção de tilápias. A prefeitura chegou a emitir alerta no dia 14 de março, informando que a água do rio estava imprópria para banho.
A situação preocupa ainda mais porque atinge um dos períodos de maior demanda pelo consumo de peixes, e coloca em risco a renda de famílias e o emprego de dezenas de trabalhadores locais.

Causas ambientais: eutrofização e esgoto comprometem qualidade da água
A Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) está monitorando a região. Em nota, a companhia informou que já realizou 926 inspeções ambientais entre 2021 e 2025 na bacia do Tietê, aplicando 80 penalidades a empreendimentos que desrespeitaram normas ambientais.
A principal suspeita é de que a mortandade foi causada pela eutrofização — fenômeno provocado pelo excesso de nutrientes na água, como nitrogênio e fósforo, provenientes de esgoto doméstico, resíduos industriais, vinhaça da cana-de-açúcar e fertilizantes agrícolas.
Segundo a professora Maria Stela Castilho, da Unesp, o aumento de nutrientes favorece a proliferação de aguapés e outras plantas aquáticas, que reduzem drasticamente os níveis de oxigênio da água, criando condições inviáveis para a sobrevivência dos peixes.
“Os aguapés consomem o oxigênio e promovem o esverdeamento da água, além de atrapalharem a navegação. Isso afeta diretamente a piscicultura”, explica a especialista.

Continuidade da piscicultura em risco
O temor agora é que a cidade de Zacarias também sofra perdas que inviabilizem a continuidade da produção local de tilápias, que sustenta centenas de famílias e movimenta a economia regional.
“Se essa mortandade se repetir aqui, será o fim para muitos piscicultores”, alerta Emerson Esteves.
A expectativa é de que os resultados da análise das amostras coletadas pela Cetesb tragam luz sobre a causa exata da mortandade em Ubarana, para que medidas preventivas mais eficazes possam ser adotadas na região.