Imagem: Parque Nacional de Yellowstone no flickr, imagem de domínio público, PDM 1.0
Imagem: Parque Nacional de Yellowstone no flickr, imagem de domínio público, PDM 1.0

O urso-pardo e o tribunal: por que a retirada da lista de espécies ameaçadas virou disputa política

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Disputa sobre o futuro do urso-cinzento reflete crescente politização da conservação ambiental nos EUA

A presença do urso-pardo (grizzly bear) na lista de espécies ameaçadas dos Estados Unidos não é mais apenas uma questão científica — virou uma disputa política que coloca em lados opostos gestores federais, parlamentares, ONGs e tribunais.

Em artigo publicado na Frontiers in Conservation Science, a Dra. Kelly Dunning, professora da Universidade de Wyoming, analisa como a Lei de Espécies Ameaçadas (ESA), criada em 1973, passou de um consenso bipartidário a um campo de batalha político.

População recuperada, mas proteção permanece

Listado como ameaçado desde 1975, quando sua população despencou para menos de 1.000 indivíduos, o urso-cinzento voltou a crescer. Hoje, só no ecossistema de Yellowstone, são mais de 700 ursos — número acima das metas de recuperação estipuladas pela própria ESA.

Ainda assim, tentativas de retirar a proteção federal em 2007 e 2017 foram barradas na Justiça. Os tribunais alegaram falta de garantias sobre conectividade genética e riscos à conservação a longo prazo. Não se trata de ausência de dados científicos, mas sim da interferência crescente de interesses políticos, disputas judiciais e pressão de grupos locais e nacionais.

Quando a política silencia a ciência

O estudo liderado por Dunning analisou mais de 750 documentos e quase 3 mil declarações de diferentes atores envolvidos no debate. A conclusão é clara: a gestão da vida selvagem está deixando de ser liderada por cientistas e técnicos para se tornar dominada por políticos, ONGs e advogados.

Parlamentares como John Barrasso (Wyoming) e Steve Daines (Montana) acusam o governo federal de manter as proteções por excesso de burocracia, mesmo após o cumprimento das metas. Por outro lado, organizações como a Earthjustice alegam que há pressão política para liberar caça e diminuir o controle federal, o que colocaria em risco os avanços conquistados.

A pesquisa da Dra. Kelly Dunning concentra-se na conservação da biodiversidade e nas dimensões humanas dos recursos naturais em áreas propensas ao turismo. Imagem: Kelly Dunning.

Tribunais e ONGs moldam o debate

Nos bastidores, quem tem vencido são os tribunais e as ONGs. Processos judiciais têm sido decisivos para manter o urso-pardo sob proteção. Essa via também tem sido a mais acessível para povos indígenas, que enfrentam dificuldades para serem ouvidos nas esferas tradicionais de poder.

O problema, segundo a pesquisa, é que esse ambiente judicializado e politizado afasta o foco da ciência e compromete a efetividade da ESA, uma legislação reconhecida mundialmente por seus resultados.

Caminhos para evitar o colapso da Lei de Espécies Ameaçadas

A Dra. Dunning argumenta que a solução está na colaboração multissetorial. Iniciativas como o Comitê Interagências do Urso-Pardo, que reúne governos estaduais, tribos indígenas, ONGs e agências federais, oferecem um modelo para decisões mais equilibradas, evitando a polarização e a judicialização excessiva.

O risco, alerta a especialista, é que a ESA perca credibilidade se continuar sendo vista como um campo de disputa entre ideologias. E, com isso, outras espécies ameaçadas podem enfrentar o mesmo destino do urso-cinzento: uma batalha política sem fim, em vez de uma política ambiental baseada em ciência e resultados.

Fonte: https://www.frontiersin.org/

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