Em 2023, o Brasil bateu recorde na exportação de carne bovina, com 2,29 milhões de toneladas vendidas para 157 países (foto: Wikimedia Commons)
Em 2023, o Brasil bateu recorde na exportação de carne bovina, com 2,29 milhões de toneladas vendidas para 157 países (foto: Wikimedia Commons)

Produção de carne bovina no Brasil emite o dobro do limite climático estabelecido, aponta estudo

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Estudo aponta necessidade urgente de adoção de práticas sustentáveis na cadeia da pecuária

A produção de carne bovina no Brasil, um dos principais motores da economia nacional, está sob os holofotes internacionais devido ao seu elevado impacto ambiental. Um estudo recém-publicado na revista Environmental Science and Pollution Research conclui que, nos moldes atuais, o setor emite mais do que o dobro do limite aceitável para que o país cumpra suas metas climáticas globais.

Segundo a pesquisa conduzida por cientistas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), as emissões da pecuária bovina devem ficar entre 0,42 e 0,63 gigatoneladas de CO₂ equivalente (GtCO₂e) até 2030. O valor permitido, de acordo com os compromissos climáticos assumidos pelo Brasil, é de apenas 0,26 GtCO₂e.

Contexto: metas do Acordo de Paris e COP30

As metas em questão fazem parte das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) — compromissos assumidos por países no âmbito do Acordo de Paris, assinado em 2015. O objetivo é limitar o aumento da temperatura média global a 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais.

No entanto, dados da Organização Meteorológica Mundial (OMM) mostram que 2024 foi o ano mais quente da história, com aumento de 1,55°C, ultrapassando temporariamente a meta crítica.

O Brasil, que será sede da COP30 em Belém (PA), apresentou uma nova NDC no fim de 2023, prometendo reduzir as emissões líquidas entre 850 milhões e 1,05 bilhão de toneladas até 2035 — uma queda de até 67% em relação a 2005.

O impacto econômico do excesso de emissões

O estudo da Unifesp utilizou o conceito de Custo Social do Carbono (CSC) para estimar os prejuízos econômicos causados pelas emissões. Esse índice mede os impactos negativos para a sociedade, incluindo danos à saúde, perdas na agricultura e eventos climáticos extremos.

Com base nessa análise, o setor de carne bovina brasileiro pode gerar perdas entre US$ 18,8 bilhões e US$ 42,6 bilhões até 2030, caso continue sem adotar medidas de mitigação.

“Nosso objetivo não é dizer ‘produzam menos carne’, mas sim repensar o modelo atual de produção, que está vinculado ao desmatamento e a altas emissões”, afirma Mariana Vieira da Costa, bióloga e primeira autora do artigo.

Área da agropecuária cresceu 50% em 37 anos

Dados do MapBiomas mostram que, entre 1985 e 2022, a área dedicada à agropecuária no Brasil aumentou 50%, alcançando 282,5 milhões de hectares — cerca de um terço do território nacional.

Desse total:

  • 58% são pastagens (164,3 milhões de hectares);
  • 64% da expansão se deve ao desmatamento para criação de pasto (64,5 milhões de hectares);
  • A Amazônia superou o Cerrado como bioma com maior área de pastagem.

A carne bovina e os limites do consumo

Em 2023, o Brasil bateu recorde de exportação de carne bovina:

  • 2,29 milhões de toneladas exportadas para 157 países
  • Faturamento de US$ 10,55 bilhões

Se a produção fosse ajustada para se manter dentro do limite de emissões da NDC, o consumo interno de carne bovina seria reduzido a entre 2 e 10 kg por pessoa/ano até 2030, apontam as pesquisadoras.

Soluções: políticas públicas e incentivos sustentáveis

As autoras do estudo destacam que práticas sustentáveis na pecuária podem ajudar o Brasil a cumprir suas metas climáticas sem comprometer sua economia. Algumas sugestões incluem:

  • Ampliação do Plano ABC+, que incentiva práticas de baixa emissão;
  • Isenções fiscais e linhas de crédito verde;
  • Créditos de carbono como alternativa de renda para produtores;
  • Integração entre universidades, governo e produtores rurais.

“A diversificação de incentivos é essencial para promover mudanças significativas e viáveis em larga escala”, reforça Costa.

Pesquisa com apoio da Fapesp

O estudo foi desenvolvido pelo Laboratório de Economia, Saúde e Poluição Ambiental (Lespa/Unifesp) e contou com apoio da Fapesp. Além de Mariana Costa, participaram a bióloga Daniela Debone e a professora Simone Miraglia, coordenadora do Lespa.

Segundo Miraglia, os dados reforçam que a inação pode agravar ainda mais os impactos das mudanças climáticas:

“Se não reduzirmos as emissões, teremos prejuízos econômicos adicionais — desde perdas na agricultura até o aumento da mortalidade por eventos climáticos extremos”, alerta.

Fonte: Agência Fapesp

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